O brasileiro estava desesperado para gostar de alguma coisa. Era morte demais, pobreza demais, meses demais vendo o país naufragar, sem poder fazer nada além de bater uma panela. A ideia de ver um grupo de pessoas trancadas em uma casa, sendo obrigadas a conviver umas com as outras, pode ter soado como uma solução.
Para além da minha habitual rotina de trabalho, haveria então uma estranha forma de vida, para mim antes desconhecida? Uma vida invisível como a das plantas, que antes eu mal notava e logo passei a regar diariamente?
Onde o sabor de aventura na viagem até às cidades dos festivais? Onde o cheiro das salas escuras, pescoços alongados para ver melhor o grande écran? Onde as festinhas com espectadores e realizadores enfim juntos no mesmo plano?
O cinema, em seu modelo de exibição, vem sendo particularmente afetado. Os gigantes do streaming, que já se mostravam vorazes, avançam com muito poder de fogo numa luta cada vez mais desigual. Toda a cadeia de exibição está sendo desmontada.
Justo quando pensamos estar fazendo uma coisa sumamente importante pela vida na Terra, podemos estar contribuindo para a sua mais completa destruição.
As solidões da infância, sejam físicas ou metafóricas, são um terreno árido que demanda muitas águas. E estivemos, nós adultos, todos nele, inevitavelmente.
Vistas juntas, Bergman e Fischer fazem um contraste luminoso de matéria e espírito.
O ano de 1927 talvez tenha sido um dos mais decisivos na vida de Walter Benjamin [1892-1940], sobretudo em sua relação com a política e, especialmente, em sua interpretação da trama que se estabelece entre política e cinema.
Não é porque você se tornou artista que isso te eximirá de ser um completo idiota. Ser artista não te salva de nada: nem das agruras da vida, nem da timidez, nem da falta de consistência política, nem da burrice, nem da canalhice.
Há tretas que valem textão no facebook, há tretas que valem um doutorado. O filme em questão merece um meme.
É curioso demais reviver o não-vivido. Ter aquele tipo de memória do que foi vivido por outros, mas não experienciado pessoalmente. Mais curioso ainda, é imaginar que essa memória existe, de alguma maneira, porque um pedaço de si já esteve no passado, no corpo e mente de pessoas que sequer sabemos o rosto.
É preciso se adaptar, deixar que o corpo seja invadido pelo cinemão, abandonar o mundo-de-fora; os carros que atravessam barulhentos as avenidas, os casais que passeiam de mãos dadas...
Quem já presenciou o vai-e-vem glamuroso dos festivais ou já foi hipnotizado pela variedade de camisas estampadas com flores, geometrias graffiti e caveirinhas, não suspeita que aquelas pessoas estejam, na verdade, absortas na nobre tarefa delegada aos cineastas do segundo milênio: capturar o real.
Tem gente que recebe Deus quando filma, tem gente que filma procurando Deus. Em trocadilho com o que diz o cancioneiro popular, tomo o dito por empréstimo para me ater a uma premissa teológica que creio ser a mais adequada para acomodar o trabalho cinematográfico de Alexandre Guena.
É bem provável que sobrem a câmera na mão, a ponta no pé, a máscara no rosto. É bem comum sobrar a trilha sonora escolhida. É presuntivo que restem elementos que não se encontram porque lhes falta aquilo que lhes daria algo em comum: a ideia. Aquilo que os faria, como em uma assembleia, dialogar sobre o motivo daquela reunião.