Crítica da Crítica | Cênicas


E AGORA?

agosto de 2017

Edição:


http://www.agoracriticateatral.com.br/home

A Revista AGORA / Crítica Teatral nasce em 2015, resultado de uma oficina de Crítica Teatral realizada pelo Goethe Institut de Porto Alegre com participação de Jürgen Berger. Seis críticos de diversas áreas do país que compunham essa oficina seguiram formando a equipe original do site. Hoje, em 2017, após uma reconfiguração, Michele Rolim e Renato Mendonça assumem a revista e abrem suas postagens para colaboradores. Dentre eles, Antropositivo (SP), Questão de Crítica (RJ) e O Grito (PE).

Iniciativas como essa foram realizadas aqui na cidade de Salvador pelo Festival Latino Americano de Teatro (FILTE) e Festival Internacional de Artes Cênicas (FIAC-BA). Entretanto, os grupos que seguiram fazendo críticas na cidade após este período aos poucos foram se desfazendo. Ao contrário da AGORA, seguiram como iniciativas autônomas sem apoios institucionais.

O site da Revista AGORA é simples e tem uma navegação bastante agradável. É fácil localizar as informações que se deseja, bem como encontrar formas de ter uma visão panorâmica do conteúdo já publicado, que é dividido em duas sessões: “reflexões sobre espetáculos apresentados no Brasil e no mundo (seção Crítica), textos de teoria, entrevistas e reportagens (seção Cena Teatral) ”. A revista se afina com a Barril na crença de que “uma relação construtiva e horizontal entre a crítica e a cena é fundamental para o fortalecimento da produção teatral de qualquer país”.

Talvez por ser majoritariamente formada por jornalistas (entre AGORA e colaboradores) seus textos são bastante descritivos e sempre encontram espaços para algumas aspas, principalmente em colocações políticas “comprometedoras”.

Um texto que me chamou bastante atenção foi o texto publicado em junho desse ano, intitulado O Teatro no Brasil está politicamente desperto. Adaptando o ditado popular que nos lembra que nunca é tempo demais: Brasil é território demais.

No texto, a crítica alemã Dorothea Marcus comenta duas montagens de Porto Alegre financiadas pelo Goethe e dirigidas por Alexandre Dill e Camilo de Lélis, ambas com textos do dramaturgo alemão Wolfram Lotz. É um texto que se permite tensionar as proposições do dramaturgo e as abordagens dos diretores, apontando escolhas excessivamente ilustrativas, por parte da direção, que enfraquecem o impacto político proposto por Lotz através de sutilezas.

Entretanto, é curioso fazer uma análise tão precisa sobre os efeitos da colonização colocados em discussão nos textos e montagens tomando um território tão grande e diverso como o Brasil por duas montagens do mesmo lugar. Que poderia ser caracterizada como uma abordagem colonial. Marcus cita outras duas obras presentes no festival do Palco Giratório que alimentaria a sua tese do teatro políticamente desperto no país:  O quadro de todos juntos, do grupo Pigmalião Escultura que Mexe, de Belo Horizonte e Ruínas de anjos, do grupo baiano A Outra Companhia de Teatro. Mas ao citá-los e não desenvolvê-los, ao mesmo tempo que torna clara a sua postura em ser abrangente, endossa uma postura de apagamento de uma diferença possível.

Mas o Brasil, enquanto diversidade territorial, não está mal representado apenas nesse texto. Não que esta seja uma afirmação propriamente surpreendente, mas as iniciativas teatrais e politicamente engajadas fora do eixo não são levadas em consideração, mesmo para uma revista que nasce e se mantém num contexto onde o trânsito é possível (vide suas viagens para inúmeros festivais, inclusive fora do país).

Num país como o nosso, que sabota estruturalmente trocas, intercâmbios e mobilidade dentro do próprio território, seria a dificuldade de receber informações acerca da produção em outras partes do país a responsável pela ausência (proporcional) da produção fora do eixo na AGORA?

Existe no site uma tag intitulada “cena fora do eixo” que contém apenas um texto intitulado Práticas políticas da cena contemporânea – A cena fora do eixo, no qual analisam um seminário de mesmo nome, onde se fizeram presentes grupos do Maranhão, Paraíba e Rio Grande do Sul. Neste encontro discutiu-se se ainda seria possível “viver de teatro” fora do eixo com o desmantelamento do Minc e o retrocesso nas políticas culturais, repetindo um comportamento que venho notando mesmo aqui na cidade: se discutimos a produção fora do eixo, discutimos aspectos estruturais, quase nunca poéticos.

Em uma outra tag, intitulada fiac2016, encontram-se três textos produzidos aqui na soteropólis, durante o Festival Internacional de Artes Cênicas. Mas, mesmo aqui em Salvador, na programação do FIAC 2016, que, nessa edição, fez um recorte sobre engajamento político na obra de arte, não houve uma tentativa de aproximação com a cena local por parte da revista, Renato Mendonça, que escreve nesta tag, escolheu produzir sobre uma produção paulista, uma chilena e uma uruguaia.

Grada Kilomba, em sua vinda à Salvador, como residente do programa Vila-Sul, proposto pelo Goethe, fala no Teatro Vila-Velha sobre três princípios básicos na relação colonial: 1 – O colonizador NÃO SABE sobre o OUTRO. 2 – O colonizador NÃO PRECISA saber sobre o OUTRO. 3 – O colonizador NÃO QUER saber sobre o OUTRO.

Para finalizar, deixo aqui uma pergunta: Pensando nesses princípios discutidos por Kilomba, é possível em tempos de crise descolonizar a produção poética no território Brasileiro? E que papel teria a crítica nesta reconfiguração?

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