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"Corpo-arquitetura", Coletivo Teatro Dodecafônico
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Recortar enquadramentos, escolher pontos de vista e ocupar o espaço preenchendo ou ressaltando a arquitetura que nos observa. Arquitetura como um conjunto de componentes que se encontram em determinado espaço. Ela é mais do que aquilo que se vende nas casas de construção; compreende também as carnes, a memória, o lixo e o acaso. A pesquisa do Coletivo Teatro Dodecafônico com corpo e arquitetura ganhou força quando entramos em contato com a série de fotografias Körperkonfigurationen (Body Configurations), criada pela austríaca VALIE EXPORT, ao longo de uma década, a partir de 1972. Essa série tornou-se um material ao qual as performers passaram a reagir. Uma reação não é um reperformance. Reagir é responder, criar uma ação por si próprio, mas tendo referência. Reagir é escolher a raiz. Reverenciar, responder à pergunta: o que ou quem te move?

Diferente de EXPORT, que criava interferências sobre as fotos impressas, o Dodecafônico passou a criar interferências no espaço fotografado. Linhas traçadas com fita crepe, sal grosso ou o escorrer da tinta. Papel ao vento, papel que esconde e revela; cria divisórias mais doces e movediças que paredes. Pó de café para aromatizar a foto. E assim os corpos se dobram, explorando seus ângulos retos e suas curvas sutis. Essa arquitetura de carne e osso é nômade; sai em disparada assim que o dedo apoia sobre o botão que imortaliza a imagem. Cabelos ao vento captados sobre diferentes materialidades. Os corpos dimensionam os planos e tornam a cidade mais palpável. Eles se recusam à pressa e resolvem sentir o gosto do cair da tarde. De repente São Paulo ganha outra umidade, como se uma água de rio doce e limpo evaporasse e aumentasse a densidade do intervalo entre os olhos e o asfalto. Os corpos prolongam as linhas e perdem as cabeças. Frente e verso, figura e fundo, para cima e para baixo: já não faz mais sentido. A paisagem se confunde entre a construção de cimento, o vento e a coisa orgânica; por onde o sangue escorre, a multidão atravessa e não para, não para, não para nunca. Pronto, virou chão batido, virou pó.

Corpo-arquitetura fala sobre nossos desejos de camuflar-se, de confundir-se, de construir outras paisagens ou sermos levadas pela brisa fresca que ainda há. Corpo-arquitetura é quando São Paulo nos atravessa e resolvemos nos imprimir nos seus degraus, no seu skyline, na sua urgência. É corpo de mulher que se mostra, apesar das ameaças, com força e pelo direito à permanência.


A série Corpo-arquitetura foi realizada pelas artistas Beatriz Cruz, Sandra-X (performers), Cacá Bernardes (fotógrafa) e Vânia Medeiros (artista visual), a partir das pesquisas feita pelas artistas no Coletivo Teatro Dodecafônico, do qual fazem parte.

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